terça-feira, 27 de julho de 2010

Brasil é o 12º lugar em violência contra mulher





RIO - A morte da modelo Eliza Samudio chamou à atenção da mídia por conta da brutalidade supostamente cometida pelo goleiro Bruno, capitão do Flamengo. O caso fez a sociedade lembrar dos perigos da violência contra a mulher, especialmente através dos erros cometidos pela própria Justiça antes do desaparecimento da vítima.

Na ocasião do crime, Eliza pediu ajuda às autoridades e recebeu um não como resposta da juíza Ana Paula de Freitas, do 3º Juizado da Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher. À mercê das ameaças de seu amante, ela desapareceu em junho.

Mas Eliza não está sozinha. Longe disso. A cada duas horas, em média, uma mulher é assassinada no Brasil, segundo dados da pesquisa "Mapa da Violência 2010", do Instituto Sangari. Na grande maioria desses casos, maridos, namorados ou ex-parceiros estão envolvidos no crime. Entre 1997 e 2007, foram 41 mil mulheres mortas no país, o que coloca o Brasil em 12º segundo lugar no ranking mundial de homicídios de mulheres.

- Fui vítima de violência doméstica e, por pouco, não morri - conta a comerciante Rosângela de Sá, de 42 anos. - O que eu aprendi e conto para as mulheres é para que elas não convivam com violência. A lei sozinha não nos protege. A vítima precisa de iniciativa.

No ano passado, Rosângela teve 80% do corpo queimado quando seu marido, de quem estava se divorciando, tentou matá-la. Walmir dos Santos Francisco, 47 anos, invadiu a casa em que a comerciante morava com uma garrafa de gasolina e colocou fogo nela e no sobrinho.

- As mulheres são vítimadas em situações semelhantes à minha porque nunca acreditam que o marido pode ir tão longe. - analisa Rosângela. - A Lei Maria da Penha nos ajuda, mas não coloca um policial nas nossas casas.

Preconceito

Coincidência ou não, o alerta que Rosângela faz é o mesmo que as autoridades deram ao analisar a decisão da juíza responsável pelo caso Eliza Samudio. Para a comerciante, apesar de todos os avanços na legislação e a criação de juizados especiais, a sociedade ainda é machista. E as próprias pessoas que trabalham na área de violência contra a mulher incorporam esse preconceito.

- Quando fui atendida na Delegacia da Mulher, fizeram pouco caso do que tinha acontecido comigo e disseram para minha irmã que eu era mentirosa - conta Rosângela, que não pôde ir pessoalmente à polícia prestar queixa porque estava internada em estado grave. - A própria mulher não defende a mulher.

Socióloga diz que Eliza foi violentada pelo poder público

O preconceito institucional ainda é uma das maiores barreiras na prevenção da violência contra a mulher. Segundo a socióloga Jaqueline Pitanguy, as próprias autoridades que deveriam combater este tipo de abuso fazem pouco caso dos problemas vividos pelas vítimas. Diretora-executiva da ONG "Cidadania, Estudo, Pesquisa, Informação e Ação", ela concorda com a visão de Rosângela, vítima que teve 80% do corpo queimado pelo marido.

- A cultura institucional do sistema judiciário ainda está atrelada ao julgamento popular de que uma mulher que tem uma vida sexual movimentada, como era o caso de Eliza Samudio, merece sofrer violência - explica a socióloga. - Eliza também foi violentada pelo poder público.

A desconfiança de que as autoridades vão tratar a violência com descaso também afeta as vítimas. Enquanto Rosângela não crê que a Lei Maria da Penha garanta a segurança das vítimas, Jaqueline vê melhoras na cidadania da mulher no país. Mas admite que ainda há muito a ser feito.

- Tivemos avanços significativos em relação à legislação, políticas públicas e crescimento de ONGs voltadas para o assunto - conta a socióloga.

No estado do Rio de Janeiro, uma das ONGs mais atuantes é o Movimento de Mulheres de São Gonçalo. Para Marisa Chaves, fundadora da ONG, denunciar qualquer agressão às autoridades é fundamental.

- As mulheres que pedem ajuda diminuem à metade, no mínimo, as chances de deixar a violência terminar em tragédia - avisa Marisa, também conselheira da Comissão Especial de Segurança da Mulher. - Nós ajudamos a Rosângela. Como ela, muitas mulheres não percebem que já fazem parte de um ciclo de violência, daí a necessidade de conscientização sobre o problema.

Jorge Lourenço, Jornal do Brasil

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